terça-feira, 8 de junho de 2010

Testemunho: de escola em escola, sem condições, pressionada e com salários em atraso

Recebemos mais um testemunho, duma profissional das AECs que partilha a sua história. A extrema precariedade e o total desrespeito pelos direitos dos professores das AECs é mais uma vez ilustrado por eta situação concreta: a Maria foi obrigada a procurar trabalho em vários pontos do país, forçada a saltar de escola em escola, à procura de horários que permitam pagar as contas, sempre com receio do dinheiro não chegar, às vezes com salários em atraso, sujeita a ordens ilegais e sem qualquer critério pedagógico, à mercê das pressões e às habituais arbitrariedades.


Carrega em "ler mais" para ter acesso integral ao testemunho. É importante denunciar e trocar estas experiências concretas. Não estamos sozinhos e temos que o saber: somos milhares, em todo o país, sujeitos a condições inaceitáveis e ilegais. Se nos querem sozinhos, para estarmos silenciados e assim incapazes de superar esta situação, devemos responder partilhando a nossa situação, dando a conhecer a triste realidade das AECs de Norte a Sul do país e lutando para que acabe esta vergonha. Envia-nos também o teu testemunho - é mesmo importante!

Tendo concorrido pela internet às AECs da Grande Lisboa, uma vez que no norte do país as vagas são mínimas, logo fui contratada a recibos verdes pela Know How, sendo combinado ter um horário completo com essa empresa. Salientei bem que só com horário completo deixaria o Porto onde sempre vivi. Instalei-me em Lisboa e quando me apresentam o tal horário, fico surpresa pois iria ficar em quatro escolas, ou seja três infantários e uma publica; os infantários sem material algum para a aula de música, logo no final do 1º mês me advertiram que teria de pôr os bebés de um ano a cantarem; logo contacto com várias entidades, como a Associação Portuguesa de Educação Musical, Meloteca, Casa da Música, e todos disseram o mesmo: nunca isso seria possível visto que crianças nessa faixa etária nem sequer sabem falar.


Logo em Dezembro me dispensam dos infantários, reduzindo o horário de 20 horas para dez horas, isto sem qualquer contracto escrito. Fico numa situação desesperada, pois tenho filha a estudar, além de ter que pagar uma renda de casa. Em suma, trabalho para pagar a renda. A mesma empresa resolve de novo mudar-me de escola em Janeiro de 2010, sempre as mesmas 10 horas semanais; nessa altura já tinha percorrido cinco escolas, só em um período escolar.

Ingresso na escola básica Stº Condestável, onde os pais exigem consultar os nossos sumários e programas, além de exigirem que se dêem aulas de música ao 1º ano, com leituras em pautas, e nada de música no sentido lúdico; apesar de gostarem das minhas aulas, resolvo procurar um horário completo de forma que o ordenado dê para cobrir despesas.

Em Fevereiro consigo o tal horário em um agrupamento de Caneças; quando julgo estar tudo a rolar melhor, eu e meus colegas somos confrontados com uma guerra entre a Scool, a coordenadora da escola e a associação de pais; então a Scool atrasa-se quase um mês nos ordenados dos professores; exigindo mapas mensais, planificações mensais, presenças e faltas ou desistências de alunos. Por sua vez a coordenadora não autoriza que os mapas sobre avaliações saiam para a empresa; então somos umas bolas de ping pong, pois se fazemos a vontade a uns estamos a infringir com outros; até já fomos ameaçados de termos de entrar por uma nova porta só para as AECs; também fotocópias é coisa proibida para AECs, além de não podermos consultar nada na internet ou na biblioteca; tudo isto com a ameaça de no próximo ano lectivo não voltarmos a ser convidadas para essa escola; refiro também que possuo curso complementar de piano do Conservatório de Música, habilitação mais que suficiente. Nesta vida há quatro anos estou a pensar seriamente mudar de profissão.

Maria da Conceição Lurdes Bicho

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